domingo, 29 de março de 2009

Desembargadora solta presos pela PF e contesta De Sanctis

Decisão beneficia diretores da Camargo Corrêa e mais seis detidos na quarta-feira

Magistrada do TRF afirma que argumentos para prisão de acusados na operação da PF Castelo de Areia revelam apenas "meras conjecturas"

JOSÉ ALBERTO BOMBIG
FERNANDO BARROS DE MELLO
DA REPORTAGEM LOCAL

A Justiça Federal decidiu ontem à tarde libertar os dez presos pela Polícia Federal durante a Operação Castelo de Areia, deflagrada na última quarta-feira, em São Paulo, e que teve a construtura Camargo Corrêa como principal alvo.
Foram beneficiados pelos habeas corpus concedidos pela desembargadora Cecilia Mello, do TRF (Tribunal Regional Federal) da 3ª Região, os diretores da Camargo Corrêa Pietro Francesco Giavina Bianchi, Fernando Dias Gomes, Dárcio Brunato e Raggi Badra Neto, as secretárias da empreiteira Darcy Flores Alvarenga e Marisa Berti Iaquinto, e os supostos doleiros José Diney Matos, Jadair Fernandes de Almeida, Kurt Paul Pickel e Maristela Sum Doherty.
A desembargadora concedeu habeas corpus diferentes para as sete pessoas que foram presas temporariamente (com prazo determinado) e preventivamente. Em uma das decisões, ela afirma que as palavras e expressões utilizadas para justificar a "custódia cautelar" revelam "meras conjecturas":
"Observo que as palavras mais referidas no despacho impugnado [decisão de De Sanctis] revelam meras conjecturas. A título exemplificativo são elas: "teriam sido; supostas; poderia estar havendo, poderia, suposto, eventual'", escreveu.
A prisão dos acusados, que deflagrou a operação, foi decretada pelo juiz Fausto Martin De Sanctis. O juiz é o mesmo da Operação Satiagraha, que chegou a prender o banqueiro Daniel Dantas no ano passado.
Em outro trecho, a desembargadora Cecilia Mello afirma: "(...) afigura-se patente a ilegalidade do decreto de prisão preventiva e o constrangimento em sua manutenção".
Ela também cita jurisprudências e "entendimentos" do STF (Supremo Tribunal Federal) e do STJ (Superior Tribunal de Justiça) para embassar os habeas corpus que libertaram todos os dez presos.
Segundo a desembargadora, a decisão não demonstrou a necessidade "in concreto" das prisões. "Ao juiz cabe sempre demonstrar concretamente a existência de atos inequívocos que indiquem a necessidade incontrastável da medida, o que não ocorreu".
Alberto Zacarias Toron, advogado de Kurt Paul Pickel, apontado pelas investigações como doleiro, disse que a decisão da desembargadora federal fez um "reparo severo" às apreciações de De Sanctis na ordem de prisão.
Os acusados foram soltos da carceragem da PF em São Paulo por volta das 19h de ontem.
A Folha tentou entrar em contato com a assessoria do Ministério Público e do juiz Fausto Martin De Sanctis, mas não conseguiu localizá-los no fim da tarde de ontem.

Remessas
Segundo o Ministério Público Federal e a PF, a empreiteira Camargo Corrêa é suspeita de remessa ilegal de dólares para o exterior, superfaturamento em obra pública, doação ilegal para partidos e lavagem de dinheiro. A empresa nega as acusações.
Transcrições de escutas telefônicas feitas com autorização da Justiça apontam que a empreiteira fez doações ilegais a partidos, segundo a polícia. O relatório da PF cita PSDB, DEM, PPS, PSB, PDT, PMDB e PP, que negam caixa dois. A Fiesp é apontada na investigação como intermediária das doações a políticos, mas nega.
Em um dos trechos de suas decisões, a desembargadora afirma que a Camargo Corrêa "é empresa que mantém relações de trabalho em diversas localidades do mundo, sendo notória, inclusive pelas publicações de seus balanços financeiros, a realização de inúmeros pagamentos e recebimentos no exterior".
Beneficiária de empréstimos milionários do BNDES, a Camargo Corrêa é parceira do governo federal em algumas das principais obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e integra consórcios responsáveis pela expansão do metrô e pela construção do Rodoanel, em São Paulo, e pelas obras do Centro Administrativo de Minas Gerais. A empresa também detém concessão de serviços públicos em vários Estados, como administração de rodovias, transmissão de energia e limpeza urbana.

Doações a partidos
A desembargadora também afirma que a investigação deveria ter analisado a documentação dos tribunais eleitorais: "(...) evitando-se, com essa simples, natural e lógica sequência investigatória, a criação de situações desnecessariamente constrangedoras para ambos os pólos envolvidos, doares e recpetores", escreveu.
Os senadores José Agripino Maia (DEM-RN) e Flexa Ribeiro (PSDB-PA), citados no inquérito da Polícia Federal, apresentaram recibos de doações da Camargo Corrêa para os diretórios estaduais de seus partidos. Os documentos ainda não foram analisados pelos TREs (Tribunais Regionais Eleitorais) de seus Estados.
A Procuradoria decidiu investigar em todo o país as obras da empreiteira que tenham apresentado indícios de irregularidade para verificar se os problemas têm conexão com supostas doações ilegais.
As obras da Refinaria Nordeste e da usina de Tucuruí, das quais a empresa participou, serão investigadas sob suspeita de superfaturamento. Para a Procuradoria, eventual dinheiro pago a mais pode ter sido usado em doações irregulares.

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