segunda-feira, 29 de junho de 2009

Elementos constitutivos das polícias

Estamos vivenciando uma era de mudanças rápidas, conseqüência de uma profunda análise epistêmica dos arcaicos paradigmas. A todo o momento os conceitos paradigmáticos de polícia repressiva vão se esvaindo da sociedade contemporânea. Autores como Bayley, Soares, Balestreri, e outros, entendem que usar a polícia como instrumento meramente repressivo não é um instrumento eficaz para se combater o crime. De certo modo, até pouco tempo, ás polícias não foram estudadas e submetidas a uma análise crítica por parte da comunidade científica. É difícil encontrar na literatura informações a respeito das polícias. Segundo Bayley (2001, p.16) “A polícia só é percebida durante eventos dramáticos de repressão política...”, esta é uma das razões pela qual a polícia não foi estudada e colocada à prova pela comunidade científica durante muito tempo.
Corroborando com a afirmativa de Bayley, Soares (2006, p.111) diz que: “as polícias e as prisões ficaram à margem do processo.” E que em decorrência deste desleixo a sociedade esta pagando um alto preço pela negligência coletiva. Na visão de Bayley (2003) “a falta de participação da polícia em grandes eventos históricos, o não envolvimento em marchas heróicas, as missões rotineiras e a lida com os problemas humanos de forma particular são características que afastaram a comunidade científica da polícia”, desta forma as polícias, não foram criticadas e avaliadas de forma sistêmica. A construção de um mundo melhor, sem o uso exacerbado da violência, passa a ser um dos objetivos a serem atingidos pela sociedade moderna. O bem estar social passou a ser perseguido por todas as comunidades e aqueles que ainda persistem em admitir o uso da violência como ferramenta para resolver seus problemas sociais e subjugar o seu semelhante perde espaço na sociedade atual.
A utilização da força física vem sendo inserida no ordenamento jurídico de forma estratégica e a violência vai sendo retirada das mãos da sociedade privada. Não é mais aceitável a utilização da violência por parte da sociedade, sendo admitido o uso da força somente em algumas situações, como por exemplo, agir em legítima defesa. Não sendo mais possível a utilização da força física por parte de algumas pessoas ou grupos formados em uma sociedade, foi necessária se criar uma força que desempenhasse sua missão de forma a atender os interesses da coletividade. Segundo ROLLIM (2006, p.25) “Era preciso, então, uma estrutura permanente e profissional que estivesse sempre nas ruas.”, desta forma foi necessário permitir, de forma residual, o uso legitimo da força por parte de profissionais treinados e autorizados. Emergindo desta autorização as Polícias da sociedade moderna.
As polícias são instituições que a todo o momento são acionadas para atuar em diversas ocorrências, seja para dirimir problemas sociais com alta complexidade, seja para prevenir ou restaurar a ordem pública ou simplesmente para orientar as pessoas. Para se ter uma idéia da instituição policial é fundamental definir os elementos constitutivos da polícia. Para Bayley (2001, p.20) “a exclusividade do uso da força de forma legítima, a atuação interna e a autorização coletiva (legitimidade), são os três elementos constitutivos da Polícia.”

a) Exclusividade do uso da força

Essa exclusividade, é uma característica essencial da polícia moderna, embora exista outros segmentos que usam da força para restaurar a ordem ou influenciar no comportamento das pessoas ou de grupos sociais.
Todavia, o uso legitimo da força é uma exclusividade das Polícias. Segundo Bayley (2001), é necessário ao policial ter autorização para utilizar a força. Sem essa autorização o policial não seria reconhecido.

“O policial é, apenas o policial, está equipado, autorizado e requisitado para lidar com qualquer exigência para a qual a força deva ser usada para contê-la” contudo, se este policial não tiver a autorização para utilizar a força física, tornar-se-á irreconhecível. Existem outras comunidades que exercem a força, como forma de coerção, mas o policial é o único executivo da força. (Bayley, 2001, p.20).

A instituição policial deve e pode fazer uso da força, no desempenho de sua missão, de forma tal que esse uso não vá além do necessário não se constituindo força excessiva ou uma ação violenta por si só. É considerado uso legítimo da força, a utilização desta, pelas Polícias modernas, até o momento em que a extensão das medidas utilizadas para conter a resistência não ultrapasse o limite mínimo do seu uso. O uso legítimo da força somente é admitido quando se faz necessário a autodefesa, com o objetivo de coerção ou na constituição de força policial para atuar em nome de terceiros. Não é simplesmente o uso da força que caracteriza a distinção da polícia das instituições privadas e sim, a autorização que ela tem para fazer uso dessa força.

b) Atuação interna
A formação dos policiais é voltada para a atuação dentro de um espaço delimitado. As atividades rotineiras são voltadas para um grupo de pessoas pertencentes a uma sociedade previamente definida. Os policiais são treinados e formados para agirem dentro da legalidade, dentro de um espaço territorial delimitado e agir de acordo com a demanda dos cidadãos. Segundo Bayley, (2001, p.20) “A estipulação de uso interno da força é essencial para excluir exércitos.” Na visão de Bayley esta característica é fundamental para que possamos desvincular a função policial da atuação dos Exércitos.

c) Autorização coletiva (legitimidade)
Quando a força é utilizada pela sociedade privada, o termo, Polícia, é totalmente excluído. Todas as pessoas podem prender , mas a polícia deve e detêm a legitimidade de usar a força para executar as suas tarefas e cumprir a sua missão. As polícias não se distinguem somente por ter exclusividade em utilizar a força, mas pelo fato de ser legítimo o seu uso. Os elementos constitutivos das Polícias modernas não são suficientes para caracterizar as instituições policiais, sendo conveniente comentar os atributos de uma polícia moderna.

Os atributos das polícias modernas se constituem de três fatores principais: o caráter público da polícia, a necessidade de especialização e a importância incondicional de sua profissionalização. Esses atributos são indispensáveis para distinguir a polícia das demais comunidades que exercem controle social.

1) O caráter público das instituições policiais: é definido por Bayley (2001, p.36) “como sendo paga por e controlada pelas comunidades (governo), agindo coletivamente.” Desta forma não podemos confundir polícia pública com a polícia privada, pois esta não é paga ou direcionada para a coletividade. A credencial é condicionada à formação, orientação, pagamento e controle por parte das comunidades, sendo que a polícia pública tem como prioridade o cumprimento da Lei fazendo uso da força legitima.

2) Especialização
“O policiamento se torna especializado quando as agências são direcionadas a se concentrar principalmente na aplicação de força física”, Bayley (2001, p.25). Esta característica é fundamental para que possamos mensurar os impactos da utilização da força física dentro de um sistema governamental. Com a nova realidade social e o crescimento dos crimes violentos, tráfico, crime organizado, etc., a especialização das polícias vem crescendo. Segundo Bayley “...uma força policial especializada concentra suas forças na solução e redução da violência, enquanto que outras forças policiais não especializadas podem fazer muitas coisas além de usar somente a força.”

3) Profissionalização
A profissionalização reflete diretamente na qualidade do serviço prestado pelo policial. Segundo Bayley (2001, p.25) “profissionalização refere-se a uma preparação explícita para realizar funções exclusivas da atividade policial”. O policial truculento e desprovido de alteridade não é mais regra nas instituições policiais e sim exceção. O profissional deve ser recrutado por mérito, treinado, disciplinado e ter evolução em sua carreira. Para Bayley (2001) o uso de tecnologias modernas, autonomia, discrição e neutralidade na aplicação da lei devem ser exploradas para alcançar um fim desejável.

Referência
SOARES, Luiz Eduardo, 1954-Segurança tem saída / Luiz Eduardo Soares. – Rio de Janeiro: Sextante, 2006.
BAYLEY, David H. Padrões de Policiamento.São Paulo: Editora da Universidade São Paulo, 2002. – (Polícia e Sociedade; n. 1)
BAYLEY, David H. Nova Polícia. São Paulo: Editora da Universidade São Paulo, 2002. – (Polícia e Sociedade; n. 2)
BALESTRERI, Ricardo Brisolla – Direitos Humanos: Coisa de Polícia, Editora Berthier, Passo Fundo, RS, 2003.
DIRETRIZ para a produção de serviços de segurança pública Nº 04/2004-CG – A Filosofia de Polícia Comunitária na Polícia Militar de Minas Gerais

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