sábado, 9 de janeiro de 2010

Uso de algemas em cena midiática de humilhação pode afrontar a Súmula Vinculante nº. 11

Extraído de: Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes - 08 de Janeiro de 2010

Notícias STF (Fonte: www.stf.jus.br)

Corretor preso com uso de algemas alega desrespeito à SV 11 e pede liberdade ao STF

Preso em flagrante com o uso de algemas, em dezembro de 2009, pela acusação de tráfico de drogas em Rondonópolis (MT), o corretor de veículos G.A.C. ajuizou Reclamação (RCL 9734) no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo que seja reconhecida a nulidade de sua prisão, com a consequente expedição de alvará de soltura. Ele alega que teria havido desrespeito à Súmula Vinculante (SV) nº 11, da Suprema Corte, que disciplina o uso de algemas por parte da polícia. O advogado do corretor revela, na reclamação, que as imagens apresentadas por duas emissoras de televisão locais mostram seu cliente descendo do camburão da viatura policial algemado, com as mãos para trás, escoltado por policiais armados. Para a defesa, trata-se de verdadeira cena midiática de humilhação e afronta à SV 11, do STF. Isso porque, no entendimento do advogado, G.A.C. e sua esposa não teriam demonstrado resistência, intenção de fuga ou oferecido qualquer forma de risco. Não houve a justificada excepcionalidade escrita por parte da autoridade policial, conforme exigida pela Súmula, arremata.

De acordo com os autos, após dois meses de campana em frente à residência do acusado, a Polícia Civil prendeu G.A.C. e sua esposa em flagrante, depois de cumprirem mandado de busca e apreensão e encontrarem, na lixeira da suíte do casal, 300 gramas de uma substância aparentando ser cocaína.

Mesmo tendo sido reconhecida a nulidade da prisão do acusado, diz o advogado, o juiz manteve sua prisão sem que fosse decretada a prisão preventiva. Se o auto de prisão em flagrante é nulo, por qual motivo o reclamante está preso?, questiona o advogado ao pedir que o STF determine a imediata libertação do acusado.

NOTAS DA REDAÇAO

A Súmula Vinculante nº. 11 trata sobre o uso de algemas nos seguintes termos: "Só é lícito o uso de algemas em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado" .

Da redação da Súmula Vinculante nº. 11 se extrai os seguintes requisitos para o uso lícito das algemas:

caso excepcional;

resistência;

fundado receio de fuga;

perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros;

justificativa da necessidade por escrito.

A Corte do STF ao editar a Súmula Vinculante nº. 11, vislumbrou dar cabo ao uso abusivo das algemas, pois nos últimos tempos as pessoas detidas eram algemadas e expostas aos flashes da mídia.

Sobre isso, o presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, manifestou que "a súmula tinha basicamente o objetivo de evitar o uso de algemas para exposição pública do preso. A Corte jamais validou esta prática, que viola a presunção da inocência e o princípio da dignidade humana, (...) em geral, a utilização de algemas já é feita com o propósito de violar claramente esses princípios. O objetivo é algemar e colocar na TV".

Em contraposição o procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza "manifestou a sua preocupação com o efeito prático da súmula sobre a autoridade policial, no ato da prisão, ou seja, que a súmula possa vir a servir como elemento desestabilizador do trabalho da polícia. O procurador-geral lembrou que, muitas vezes, um agente policial tem de prender, sozinho, um criminoso, correndo risco. Lembrou, também, que é interesse do Estado conter a criminalidade e disse que, para isso, é necessário utilizar a força, quando necessário".

Não obstante o uso de algemas não ter contado com uma regulamentação federal específica até meados do presente ano (quando a Lei 11.689/08 deu nova redação ao artigo 474 do CP)cumpre esclarecer que as regras para o bom e moderado uso das algemas foram inferidas da interpretação doutrinária de esparsos institutos em vigor e de princípios do direito, como o da dignidade da pessoa humana, da presunção da inocência, da proporcionalidade, dentre outros.

Dessa forma, seja pelo efeito vinculante da súmula, pelas regras extraídas do minucioso e atento exame de todo o ordenamento jurídico vigente, ou ainda dos princípios de direito, o uso das algemas nunca foi desregrado ou aleatório. Aliás, sobre o tema brilhantemente sintetiza o Prof. Luiz Flávio Gomes nas seguintes palavras: "Tudo se resume, conseqüentemente, no princípio da proporcionalidade, que exige adequação, necessidade e ponderação na medida e vale no Direito processual penal por força do art. 3º do CPP".

Assim, a Súmula Vinculante nº. 11 consolidou entendimento do STF sobre o cumprimento de legislação que já tratava do assunto, como também pôs fim ao sensacionalismo feito pela mídia quando uma prisão ou outro ato processual é realizado.

Autor: Daniella Parra Pedroso Yoshikawa

Nenhum comentário:

Postar um comentário