domingo, 12 de julho de 2009

Brasil adota modelo japonês de polícia

Governo enviou agentes ao Japão para serem treinados nas técnicas de policiamento comunitário existente no país

No "sistema Koban", o agente trabalha com a população para prevenir situações que possam facilitar a ação do criminoso



Após o fracasso de diversas tentativas de instalação de polícia comunitária no país, o governo federal decidiu importar do Japão um modelo para aproximar mais a Polícia Militar da população. Agentes de 11 Estados participam de um curso para a implantação do chamado "sistema Koban" no Brasil.
O método oriental está em implantação em São Paulo desde 2004. Policiais paulistas vão dar os cursos para colegas de outros Estados, com supervisão de agentes japoneses.
O convênio da Secretaria Nacional de Segurança Pública com a Agência de Cooperação Internacional do Japão e a PM de SP pretende formar 360 policiais até 2010. Eles serão multiplicadores em seus Estados.
O modelo japonês consiste na mudança da rotina policial. A linha tradicional se pauta pelo atendimento de ocorrências ou prevenção de crimes pela ronda policial.
No "sistema Koban", o agente policial trabalha com a população para prevenir a ação de criminosos.
Neste modelo, o policial deve fazer visitas aos moradores e comerciantes para saber as necessidades da comunidade. Ele trabalha em média três anos na mesma região.

Trabalho social
O sistema incentiva que o policial faça "trabalho social" onde atua: encaminhar idosos a médicos, jovens a projetos sociais e intervir junto a órgãos públicos por melhorias na região. Para os defensores do modelo, o não atendimento destes pedidos -a rigor "não policiais"- podem gerar um problema de segurança pública.
"Nosso policial é treinado para ser um caçador na busca de bandidos. Ele poderia fazer um trabalho de prevenção com a população", afirmou o capitão Cristiano Guedes, coordenador dos cursos na Senasp.
São Paulo tem 54 Kobans (postos urbanos) e 29 chuzaishos (rurais), que são as bases físicas do sistema. Mesmo no início, o modelo já é bem avaliado.
A base considerada modelo pela PM paulista está instalada no Jardim Ângela. Ali, após investimento social, a taxa de homicídios caiu de 60 por 100 mil habitantes em 1999 para dois casos neste ano, diz a polícia.
"O policiamento comunitário é menos a lógica de responder ao 190 e mais a de criar um policiamento que tem a ver com aquela área", disse Denis Mizne, diretor-executivo do Instituto Sou da Paz.
A "lógica do 190" ainda fica clara em números. No Japão, 35% do contingente atua no policiamento comunitário. Em SP, apenas 3% dos PMs atuam nessa atividade e um terço faz parte do programa de radiopatrulha -atendimento de ocorrências enviadas a uma central.
Para o sociólogo Orlando Pinto de Miranda, coordenador de pesquisa nacional sobre o tema, há indefinição no Brasil sobre o que é polícia comunitária. Ele diz que a popularidade do "selo comunitário" espalhou o termo sem que o modelo fosse adotado. "Toda forma de policiamento local foi chamada de polícia comunitária", afirma.
Miranda elogia o sistema adotado em SP, mas afirma que a boa avaliação ainda parte de "resultados tópicos".
Para ele, a principal dificuldade para sistematizar o modelo é a grande resistência dentro das corporações e a formação deficiente dos agentes.

Polícia depende da população, diz cônsul
Responsável pelo consulado japonês no Rio trabalhou no planejamento do policiamento comunitário em seu país

Para Yasuaki Ishii, que é policial, sistema no Japão é o símbolo da segurança; "Isso está arraigado na cabeça das pessoas", afirma



Policial há 28 anos, Yasuaki Ishii, 47, cônsul do Japão no Rio, afirma que o sucesso do policiamento comunitário depende também dos moradores da região atendida. Ishii, que atuou no planejamento do "sistema Koban" no Japão, afirma que, ao mesmo tempo, a polícia deve mostrar à comunidade qual sua função no local e o que a corporação pode fazer pela população. "A maioria das pessoas sabe que a polícia existe, mas não o que ela faz". Leia trechos da entrevista, concedida em japonês, com uma tradutora.



FOLHA - Como sair da polícia reativa para comunitária?
YASUAKI ISHII - Não seria uma tarefa somente da polícia. Temos que pensar o que é necessário além da mudança da estrutura policial. É imprescindível a colaboração da comunidade. O Koban no Japão é o símbolo da segurança. Isso está arraigado na cabeça das pessoas. A polícia precisa ser bem recebida.

FOLHA - Mas em muitos locais não se confia na polícia.
ISHII - É importante transmitir para a comunidade o que a polícia está fazendo por ela. A maioria sabe que a polícia existe, mas não o que ela faz. Por outro lado, a polícia não sabe o que a comunidade gostaria que fosse feito. É importante criar espaço para troca de opiniões.

FOLHA - Já houve problemas na instalação do Koban?
ISHII - Muitas vezes, o policial desconhece o que tem que fazer. Ele está trabalhando no posto, mas não sabe as suas funções. O posto existe como estrutura física, mas o sistema da polícia não mudou.

FOLHA - O policial deve atuar fora da área da segurança?
ISHII - É possível criar uma divisória clara entre o que cabe ou não à polícia? Só podemos julgar se uma reclamação tem ligação com um crime ou não depois de ouvir. Se não for cabível à polícia, encaminhe para a autoridade competente. Se esse assunto cabe à própria comunidade resolver, o policial devolve a decisão. Se você não trabalhar em contato direto com a comunidade, não vai saber nem o que deve ser feito.

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